Sunday, December 07, 2008

Sinecura* (VPV)

Uma proposta do CDS, que teria suspendido a "avaliação" de professores, não foi anteontem aprovada na Assembleia, porque faltaram à sessão 28 deputados do PSD. Verdade que também faltaram 13 do PS, três do CDS, um do PC e um do PEV. Mas, com o grupo parlamentar do PSD presente e completo, o Governo perdia, até porque seis deputados socialistas (entre eles, Manuel Alegre) votaram pela oposição e um de absteve. A dra. Ferreira Leite ficou muito indignada com este normalíssimo episódio e declarou à Rádio Renascença que uma coisa daquelas não era admissível e não se "voltaria a repetir". Claro que, muito provavelmente, os deputados do PSD (e os do PS, do PC e do PEV) não apareceram porque preferiram aproveitar o fim-de-semana "longo", a pretexto de "trabalho político" (que, pelo regulamento, justifica a ausência) ou qualquer razão do mesmo género.

A história é velha. Desde o princípio do regime que os chefes partidários só se lembram da gente que arrumaram na Assembleia quando qualquer coisa corre mal. O resto do tempo tratam os pobres "representantes da nação" como um bando de menores, sem opinião, sem responsabilidade e sem carácter. Por muito que nos custe, a Assembleia é uma espécie de escola secundária, à velha moda, onde se marcam faltas e as criancinhas vão fazendo o que lhes mandam. Estão lá para se levantarem, ou sentarem, conforme a "direcção da bancada" lhes diz para se levantarem ou sentarem, e ocasionalmente para uma pequena sessão de propaganda. Não valem nada; e nunca se envergonharam com isso.

O que se compreende. A carreira de um deputado é um longo curso de obediência e humilhação. Precisam, primeiro, de apoio local ou do patrocínio de um chefe influente de Lisboa (que geralmente se adquire por intriga e por um quase obrigatório servilismo). São, a seguir, eleitos pelo partido, sem esforço próprio (ou pouco esforço próprio). E desembarcam em S. Bento para uma vida de total ociosidade. Para efeitos práticos não existem. A Assembleia é uma sinecura e eles vêem a Assembleia como a sinecura que é. Tanto quanto possível, não põem lá os pés, trabalham "para fora", tentam viajar (oficialmente, claro) e fogem nos feriados. Não se percebe a fúria da dra. Manuela com este arranjo. Ela já por lá andou e conhece a "casa". Que esperava ela, se não o que sucedeu?

* emprego ou cargo rendoso que exige pouco trabalho

Vasco Pulido Valente, Público de hoje

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